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Deborah Goldemberg
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Insurgência Crônica

Sobreviver é fácil?

Eu sempre duvidei das estatísticas. Como eu sou formada em Ciências Sociais, consigo imaginar as tantas inconsistências nelas contidas, mas não me especializei e não consigo de fato desvendar suas falácias. A que mais me intriga é a estatística de expectativa de vida do brasileiro. Para quem não sabe, de acordo com o IBGE, a idade média em que morremos no Brasil é 72,86 anos (o equivalente a setenta e dois anos, dez meses e dez dias). Bom, né? Para mulheres, isso sobe ainda mais: 76,71 anos. Mas será que sobreviver é tão fácil?

Fico vendo a luta que é para a maior parte dos jovens brasileiros conseguir estudar e arrumar um emprego para se manter. Este é o caso até para os jovens urbanos, onde há escolas, universidades, indústrias e comércio abundante. Nas regiões rurais onde trabalhei, com cobertura escolar incompleta, a ausência de universidades e poucas oportunidades de trabalho, o índice de evasão escolar no ensino médio era enorme e as autoridades viviam preocupadas com os efeitos colaterais disso: a gravidez precoce e as drogas.

Quando perguntávamos aos jovens por que eles abandonavam a escola, eles respondiam: “Estudar pra quê? Pra cortar cana?”. Aquela pergunta ressoa nos meus ouvidos até hoje. De que vivem esses jovens e seus filhos precoces hoje? Certamente, muitos devem ter morrido cedo (antes da dita expectativa) pelas consequências da pobreza: doenças mal tratadas, acidentes ocorridos em locais distantes de socorro, além dos efeitos da falta de perspectiva, o alcoolismo e outras formas de suicídio.

Além disso, ainda na zona rural, fico pensando em quantos bebês nascem e morrem antes de serem registrados para contarem ponto na estatística da expectativa de vida. É verdade que a capilaridade do sistema de saúde é grande, mas a mortalidade infantil nas regiões mais isoladas é comum e o registro nem tanto. Há até adultos que vivem e trabalham sem documentos, estima-se que mais de 10% da população brasileira.

São os escravos das fazendas dos grotões que morrem de malária, os garimpeiros que se acidentam na lama e ali ficam, os ribeirinhos que desaparecem nas águas turbulentas dos rios e os moleques de rua vítimas de mortes violentas – pessoas que nascem, morrem e o Estado brasileiro nem nota.

Na classe média, a afluência proporciona algumas vantagens, mas eu vejo pela forma como a minha família minguou ao longo dos anos que nem assim a estatística corresponde. Meus avós, tanto de lado materno quanto de lado paterno, eu nunca conheci. Minha avó paterna morreu aos trinta e poucos anos. De parte de mãe, ambos viveram até a velhice. Se três dentre quatro avós atingiram os 72 anos da estatística, ela está somente 75% acertada.

Avançando para as gerações mais jovens, de três tias paternas, uma morreu antes dos 30 anos em decorrência de problemas de saúde mental. Incluindo meu pai, de quatro irmãos, novamente só 75% da estatística se cumpriu. De meus tios paternos, cinco irmãos, incluindo minha mãe, uma tia morreu cedo de câncer, ou seja, 80% da estatística cumprida. A mãe dos meus irmãos morreu aos 36 anos de câncer e tinha uma irmã. Neste caso, somente 50% da família cumpriu a estatística.

Dentre meus irmãos, somos quatro, um morreu cedo de câncer. Resta saber quantos de nós sobreviverão até a idade prevista nas estatísticas, mas já somos somente 75% da estatística cumprida. Temos na família com algo entre 50-80 de acerto da expectativa de vida oficial.

Sobreviver no Brasil, não é tão fácil assim…

Desconte 10% das pessoas invisíveis e uns 35% do erro estatístico (baseado nos 65% de acerto, de acordo com o histórico da minha família) e teremos uma idade mais próxima da idade em que morrem os brasileiros: 49 anos. Cuidado, a morte está mais próxima do que podemos imaginar. Se como dizem “a vida começa aos 50”, para os brasileiros ela acaba justo quando devia estar começando.

Sobreviver é difícil!

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Me too (literário)
Família sobreviver Vida
1 COMENTÁRIO
  • Maria Angelina Marzochi
    julho 11, 2019 a 1:46 pm
    Responder

    Sobreviver não é fácil e, a partir da minha percepção, olhar a vida sob essa perspectiva numérica ela parece mais trágica do que já é. Para contrabalancear vou buscar aconchego em Viktor Frankl, um sobrevivente de quatro campos de concentração, que diz que nosso dever é transformar a tragédia em triunfo – também não é tarefa fácil.

    Beijos
    Angelina

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