A natureza preservada
Você sempre curtiu o meio ambiente? Ver as tartaruguinhas do Tamar correrem para o mar em Noronha na adolescência mudou a sua vida? Acabou estudando biologia ou, então, fez administração de empresas sonhando com isso? De qualquer forma, tinha um pôster do panda da WWF na parede do seu quarto de república? Seu passeio favorito é fazer trilha ecológica em parques estaduais? Seu namorado é praticamente sócio da Decathlon? Você apoia o Greenpeace, doa a metade do seu salário e ainda acorda domingo às seis da manhã para ir recolher lixo das praias durante as campanhas? (Estou falando do domingo de carnaval). Aprender a fazer pão integral com milho orgânico com um xamã peruano foi o momento mais emocionante que você já viveu na cozinha? (Fora aquela megatrepada com aquele gato do forró, claro!). Você tem uma cadela vira-lata e ela é castrada? Você faz xixi no chuveiro, que nem a Madonna, contradizendo as convenções culturais, para economizar a água da descarga? A sua casa tem mais latas de lixo reciclado do que fotos do seu namorado? Você é vegana? Lacto-bacilo-ostra-pipoca-vegana? Você não come um grão de soja que não seja hidropônica para não correr o risco de desmatar uma árvore no Centro-Oeste? Não coloca um sapato de couro no pé há dez anos? (O couro é das vacas, para quem não entendeu… eu mesma demorei para entender essa restrição vegana, afinal, não são elas que estão destruindo a Amazônia com sua fome por capim e a camada de ozônio de tanto arrotar?).
Ok, você não viu nada. Todas essas coisas que você faz e compra e se recusa a fazer não vão te fazer sentir nem por um minuto em plena harmonia com a natureza. Na verdade, o fato é que você está tão longe desse ponto na história da humanidade, da possibilidade de haver essa plenitude, que te faz feliz toda vez que você não joga o óleo da batata frita na pia e salva um peixe.
Pequenos gestos, poéticos sim, muito provavelmente inúteis. E você sabe disse, quando vira a panela cheia de óleo dentro do saco de lixo e começa a calcular: saco de lixo plástico, milhares de anos para se decompor, o custo da gasolina para levar o lixo (resíduos sólidos, quero dizer) até o centro de reciclagem, aquele CO2 todinho saindo pelo escapamento da Kombi… acidentes de trânsito, enfim…
Dá para detonar o impacto positivo de cada uma daquelas atividades superecológicas que você alinhou para o seu programa de domingo. Trilha ecológica com tênis ecológico produzido na China com mão de obra escrava? Mochila feita com material sintético? E aquele energético dentro das garrafinhas de alumínio extraído do coração da Amazônia? Para não falar das panelas e canecas! Enfim, vou parar por aqui, mas acredito, se eu começar, não vai sobrar pedra sobre pedra!
O que quero dizer é que vai chegar um momento na sua vida em que você vai entender porque ser 100% sustentável não rende nem um décimo de eco-entusiasmo do que, simplesmente, amamentar um bebê de forma exclusiva, isto é, sem complemento de leite artificial ou chazinhos ou mesmo água mineral.
Quando nasce o seu neném você amamenta o pequeno sem pensar, ou então, pensando (demais!) sobre os horários, dores, inseguranças, sono, beber água, pegada, bico e tal e coisa. Depois de alguns meses, aquele bebê vai crescendo e crescendo e um belo dia você se dá conta de que você tem uma criança nos braços, um bebê enorme, de quase seis meses de vida, que nunca se alimentou de nada no mundo além do leite que o seu corpo produz.
Nunca houve entre ele e o mundo, entre ele e você, uma mamadeira colorida ou um copinho de vidro, uma água encanada ou de fonte cristalina, um chazinho arrancado do quintal ou em saquinhos, nada. Simplesmente, vocês caminham descalços na areia, como se faz há milhares e milhares de anos. Na verdade, há milhões e milhões de anos, quando havia apenas os chipanzés, macacos, dinossauros e todo tipo pré-humano. E é tão simples ser isso, a natureza plena, basta ter peito.
Nós, mães, somos a natureza, preservada.