A ditadura da diversão nas férias escolares
Quando minha filha entrou de férias fiz um verdadeiro cronograma de atividades para o período em que estivesse em casa. Não me rendi às colônias de férias, mas organizei festinha de fim de ano em casa, anotei os eventos para crianças que estavam rolando na cidade, convidei amiguinhos para virem em casa fazerem piquenique, uma viagenzinha pra praia, agendei idas ao cinema e teatro.
Agora que a programação de férias se exauriu, percebi que ficamos mais calmos e finalmente a sensação de que estamos de férias inaugurou-se (ufa!). Acordamos e não temos o que fazer, então, ficamos à toa, tomamos um banho no meio da manhã, improvisamos alguma brincadeira com o jornal do papai, coisas simples assim.
É incrível como estamos tão condicionados a fazer algo o tempo inteiro que as férias passaram a significar apenas a transição para uma nova ditadura – a de fazer coisas divertidas o tempo inteiro. Temos que acordar e ir fazer algo divertido, almoçar num lugar divertido, depois fazer outra coisa divertida e jantar algo divertido, ao ponto que quando chega a noite estamos tão exaustos quanto quando estamos trabalhando ou em período de aulas. As atividades coloridas e estridentes (além de muitas vezes serem caras) nunca cessam… até que elas cessaram. Estou infinitamente grata pelas férias serem tão longas, senão nunca teríamos chegado a esta semana em que estamos.
Ontem, por exemplo, não tínhamos nada para fazer. Ficamos em casa, até que me lembrei que precisava passar na biblioteca da USP para resolver uma pendência. Resolvi levar minha filha. Era uma tarefa chata, nada “divertida” como as férias demandam, mas lá fomos nós. Para minha surpresa, ela adorou as flores da entrada da FFLCH e fez questão de entrar na biblioteca para ver os livros para crianças. Ficamos lá contando histórias, depois tomamos um sorvete enorme sentadas no banco olhando os alunos com roupas estranhas e os escritos revolucionários na parede e… foi isso – tudo isso e nada mais.
Na paz da manhã e sem grandes expectativas, pudemos conversar com calma, ela me contou como tinha se sentido em relação a uma amiguinha de quem gostava muito e andava meio estranhada desde um piquenique. Olhei bem nos olhos dela e apreciei o tom de castanho que paira naquele olhar com o qual convivo diariamente, em meio à loucura das atividades, sem dizermos nada. Voltamos para casa com um ramo de flores debaixo do braço para almoçar em casa, um arroz com feijão e bife – tudo isso e nada mais.
Hoje, minha vontade é voltar para o dia 18 de dezembro e cancelar toda programação que fiz para as férias! Claro, tudo vem no seu tempo, mas queria passar outro mês inteiro fazendo nada com a minha filha. Senão cancelar todas as atividades que fizemos, ao menos, reduzi-las pela metade. Garantir um meio período dedicado ao dolce far niente, como dizem os italianos. Fica a dica para as próximas férias!